quarta-feira, 20 de setembro de 2017

13/09/91 - 17:28

O hipódromo está fechado. Não há apostas entre hipódromos com Pomona, aqui ó que eu vou dirigir nesse calorão. Provavelmente, vou acabar nas corridas à noite em Los Alamitos. O computador veio outra vez da oficina, mas não corrige mais a ortografia. Tentei de tudo para descobrir por quê. É provável que eu tenha que ligar para a loja e perguntar para o cara: “O que é que faço agora?”. E ele vai dizer alguma coisa como: “Você vai ter que transferi-lo do disco principal para o disco rígido”. Provavelmente, vou acabar apagando tudo. A máquina de escrever está atrás de mim e diz: “Olhe, ainda estou aqui”.
Tem noites em que esta sala é o único lugar onde quero estar. Ainda assim, me levanto e sou uma casca vazia. Sei que poderia fazer o diabo e fazer as palavras dançarem nesta tela se me embebedasse, mas tenho que buscar a irmã de Linda no aeroporto amanhã de tarde. Ela vem fazer uma visita. Ela mudou seu nome de Robin para Jharra. Quando as mulheres ficam mais velhas, trocam de nome. Quero dizer, muitas fazem isso. Imagine se um homem fizesse isso. Conseguem me imaginar telefonando para alguém:
Ei, Mike, aqui é o Tulipa.”
Quem?”
Tulipa. Antes era Charles, mas agora é Tulipa. Não vou mais atender ao nome Charles.”
Vá se foder.”
Mike desliga...
Ficar velho é muito estranho. A coisa principal é que você tem que ficar constantemente dizendo a si mesmo estou velho, estou velho. Você se vê no espelho quando desce no elevador, mas não olha diretamente para o espelho, dá uma olhada de lado, um sorriso amarelo. Você não está tão mal, você parece algo como uma vela empoeirada. Azar, fodam-se os deuses, foda-se o jogo. Você já deveria estar morto há 35 anos. Isto é uma cena a mais, mais uma olhada no show de horror. Quanto mais velho o escritor fica, melhor ele deve escrever, ele já viu mais coisas, já aguentou mais, já perdeu mais, está mais perto da morte. Esta última é a maior vantagem. E há sempre a nova página, a página em branco, 8 e ½ por 11 polegadas. O jogo continua. Daí você sempre lembra de uma ou duas coisas que os outros caras disseram. Jeffers: “Zangue-se com o sol”. Maravilhoso demais. Ou Sartre: “O inferno são os outros”. Direto no alvo. Nunca estou sozinho. A melhor coisa é ficar sozinho, mas nem tanto assim.
À minha direita, o rádio trabalha duro me trazendo mais excelente música clássica. Escuto isso por três a quatro horas por noite enquanto estou fazendo outras coisas, ou nada. É minha droga, lava a sujeira do dia de dentro de mim. Os compositores clássicos conseguem fazer isso por mim. Os poetas, os novelistas, os escritores de contos, não. Uma gangue de fajutos. Existe alguma coisa em escrever que atrai os fajutos. O que é? Os escritores são os mais difíceis de aguentar, nos livros ou ao vivo. E são piores ao vivo do que nos livros e isso é muito ruim. E nós adoramos falar mal uns dos outros. Como eu.
Quanto a escrever, hoje escrevo basicamente da mesma forma que fazia há 50 anos, talvez um pouco melhor, mas não muito. Por que tenho que chegar aos 51 para poder pagar o aluguel com os meus livros? Quero dizer, se estou certo e escrevo igual, por que demorou tanto? Tive que esperar que o mundo me entendesse? E, se ele me entende, como estou agora? Mal, é isso. Mas não acho que não fiquei burro por acaso. Será que um cara burro se dá conta que é? Mas estou longe de estar satisfeito. Há alguma coisa em mim que não consigo controlar. Nunca dirijo meu carro por cima de uma ponte sem pensar em suicídio. Quero dizer, não fico pensando nisso. Mas passa pela minha cabeça: SUICÍDIO. Como uma luz que pisca. No escuro. Alguma coisa que faz você continuar. Saca? De outra forma, seria apenas loucura. E não é engraçado, colega. E cada vez que escrevo um bom poema, é mais uma muleta que me faz seguir em frente. Não sei quanto às outras pessoas, mas quando me abaixo para colocar os sapatos de manhã, penso, Deus Todo-Poderoso, o que mais agora? A vida me fode, não nos damos bem. Tenho que comê-la pelas beiradas, não tudo de uma vez só. É como engolir baldes de merda. Não me surpreende que os hospícios e as cadeias estejam cheios e que as ruas estejam cheias. Gosto de olhar os meus gatos, eles me acalmam. Eles me fazem sentir bem. Mas não me coloque em uma sala cheia de humanos. Nunca faça isso comigo. Especialmente numa festa. Não faça isso.
Ouvi falar que encontraram minha primeira mulher morta, na Índia, e que ninguém da família quis o corpo. Pobre garota. Ela tinha o pescoço aleijado, não virava. Fora isso, era perfeitamente linda. Ela se divorciou de mim e devia ter feito isso. Não fui bom ou generoso o suficiente para salvá-la.
Charles Bukowski, in O capitão saiu para o almoço e os marinheiros tomaram conta do navio

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