sábado, 19 de agosto de 2017

Vidraça

Algumas pessoas olham através da vidraça, discutem sobre uma casa que estão vendo, ao longe. Uma das pessoas diz que aquela casa é habitada por um nobre, de hábitos aristocráticos e conservadores. Outra diz o contrário, que lá mora um operário, membro do sindicato, revolucionário. Uma terceira diz que os dois primeiros estão errados: ele vê a casa, mas a casa está vazia. Ninguém mora nela. Ela está vazia. Pedem a minha opinião. Eu me aproximo, eles apontam através do vidro, na direção da casa. Olho, olho, e concluo que alguma coisa deve estar errada com os meus olhos. Eu não vejo casa alguma. O que vejo são os reflexos do meu próprio rosto, nos vidros da vidraça.
Rubem Alves, in Do universo à jabuticaba

Nenhum comentário:

Postar um comentário