quinta-feira, 31 de agosto de 2017

O admirador

Era fascinado por crepúsculos. Diante de um belo pôr de sol, expandia-se: “Ah!”. Dia seguinte, o espetáculo se renovava, e ele: “Oh! Ah!”. Em certas ocasiões, perdia mesmo a conta, explodindo: “Ah! Oh! Ah!” indefinidamente.
Naquela tarde, a combinação de matizes e nuvens foi tão soberba que as exclamações habituais se converteram em urros. Os urros, de tão estrondosos, provocaram deslocamento de ar. Empalideceram os tons, desmancharam-se as nuvens, e uma catarata desabou sobre a Terra, envolvendo o amador de crepúsculos, que desapareceu em redemoinho no girar do vento, vítima de sua capacidade de admiração.
Carlos Drummond de Andrade, in Contos plausíveis

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