sábado, 30 de janeiro de 2016

Vegetariano

você precisa de um carro” ela disse. “você precisa de um tênis decente. Cortar o cabelo. Aparar essa barba horrível e correr. Correr, correr, o tempo passa, sabia?” e eu continuava olhando o gramado. A bola de futebol murcha ao lado do cachorro com sarna e o caminho do formigueiro levando pedaços de folhas. “você é um escritor incrível. Tens noção disso?” o pai dela abriu a porta e perguntou algo como “quer as linguiças de frango com pimenta? gosta de churrasco com molho de pimenta?” e as crianças pulavam com força na piscina. A água batia nos nossos pés junto com o sol que nos fazia lagrimar. “sei do seu romance. Tá bonito. Não precisa dedicar pra mim. Agora estou casada. Não quero que o Afrânio tenha ciúmes.” E o cheiro do churrasco enjoou meu estômago e levantei como um homem que iria morrer na guerra: “Tá bom, Vânia. Cuida-te.” E dei as costas como um filho que beija o rosto da mãe pela última vez antes de abraçar o mundo. E comecei a correr. A correr feito o retardado do Tom Hanks em Forrest Gump e senti pela primeira vez que o amor doía feito uma ferida cheia de pus e que só a literatura poderia desinflamar toda a saudade de Vânia. Até hoje passo mal com domingos e cheiro de carnes queimando. Ontem minha colega de trabalho me convidou para jantar um cordeiro em sua casa, mas fui cínico feito Judas: “desculpa, mas virei vegetariano”.
Diego Moraes, in ursocongelado.tumblr.com

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