domingo, 28 de junho de 2015

Burrice

Caminhavam dois burros, um com carga de açúcar, outro com carga de esponjas.
Dizia o primeiro:
Caminhemos com cuidado, porque a estrada é perigosa.
O outro redarguiu:
Onde está o perigo? Basta andarmos pelo rastro dos que hoje passaram por aqui.
Nem sempre é assim. Onde passa um, pode não passar outro.
Que burrice! Eu sei viver, gabo-me disso, e minha ciência toda se resume em só imitar o que os outros fazem.
Nem sempre é assim, nem sempre é assim… continuou a filosofar o primeiro.
Nisto alcançaram o rio, cuja ponte caíra na véspera.
E agora?
Agora é passar a vau.
O burro do açúcar meteu-se na correnteza e, como a carga se ia dissolvendo ao contato da água, conseguiu sem dificuldade pôr pé na margem oposta.
O burro da esponja, fiel às suas ideias, pensou consigo:
Se ele passou, passarei também — e lançou-se ao rio.
Mas sua carga, em vez de esvair-se como a do primeiro, cresceu de peso a tal ponto que o pobre tolo foi ao fundo.
Bem dizia eu! Não basta querer imitar, é preciso poder imitar — comentou o outro.
Monteiro Lobato, in Fábulas

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