domingo, 30 de março de 2014

John Wayne ganha nova biografia nos EUA

Wayne, The Life and the Legend diz que ator queria interpretar somente homens que espelhavam suas crenças e valores.

O ator norte-americano John Wayne - AP

Ele era um herói forte e autêntico, às vezes cabeçudo, mas consagrado à justiça e capaz de ternura e sacrifício; uma figura solitária, convocada para defender a propriedade ou resgatar a mocinha, mas, no fim, com frequência exilado no fim da civilização pós-fronteira, que já não precisava de seu tipo durão. Quer fosse pistoleiro, caubói ou oficial de cavalaria, ele se tornou a personificação da fronteira americana.
O narrador do romance The Moviegoer, de Walker Percy, lembra dele matando “três homens com uma carabina, enquanto caía na poeira da rua em No Tempo das Diligências”. Joan Didion o chamou de o “molde perfeito” no qual “os anseios de uma nação” eram derramados.
John Wayne colocou de forma mais simples: “Encontrei o personagem que o homem médio quer que ele, seu irmão ou seu garoto seja”. “É o mesmo tipo de cara que a mulher média quer para marido. Ande sempre de cabeça erguida e olhe diretamente nos olhos.” Na sua carreira, ele rejeitaria papéis – como o do intrigante e corrupto Willie Stark em A Grande Ilusão – que violavam suas crenças.
Scott Eyman, autor de uma nova biografia de Wayne, The Life and the Legend, diz que ele pretendia interpretar somente “homens que espelhavam suas próprias crenças e seus valores”.
Como o livro de Eyman deixa claro, o homem Duke Morrison não era sinônimo do personagem John Wayne que ele criou na tela. “Para Wayne”, escreve Eyman, “ele era Duke Morrison. John Wayne era para ele o que o Vagabundo era para Charlie Chaplin – um personagem que se sobrepunha à sua própria personalidade, mas não a ponto de subjugá-la”.
Eyman lembra que a persona na tela que Wayne idealizou para si – de um homem que era a um só tempo um estranho e uma figura autoritária – ajudou a transformar um garoto desajeitado e inseguro na “representação enfática de uma masculinidade americana”, que era segura de si o suficiente para abrigar uma certa melancolia e vulnerabilidade por baixo da autoconfiança.
Essa história da invenção de si mesmo por John Wayne já foi contada muitas vezes. The Searchers: The Making of an American Legend, o poderoso livro de Glenn Frankel, de 2013, sobre a obra-prima de John Ford, discute como o jovem Wayne estudou os modos do astro de western Harry Carey e as lições que aprendeu com o dublê Yakima Canutt, ex-astro de rodeios. E o livro de 1997 de Wills, John Wayne’s America, também percorreu boa parte desse terreno.
O trabalho de Eyman tem a pretensão de ser bem mais abrangente do que as obras anteriores. Às vezes, exagera, registrando fielmente filmes mais esquecíveis de Wayne. O autor também gasta bastante espaço em questões discutidas há décadas (como a relação de Wayne com a política conservadora e sua escolha de filmes).
Mas o que essa biografia faz com habilidade é dar um retrato vigoroso de John Wayne – isto é, Duke Morrison – e a Hollywood em que ele trabalhou, enquanto mapeia seu crescente domínio do ofício. Ele percorre a transição de Wayne dos papéis agitados, pueris, dos primeiros filmes a um homem dominador e confiante; do “sujeito comum perfeito” de John Ford ao “pai de todos” e, eventualmente, “avô de todos” como em Bravura Indômita. Eyman nos dá um senso vívido da relação mentor-protegido entre Ford e Wayne. Ele reconhece o conhecimento íntimo do processo cinematográfico que estava por trás daquele ‘à vontade’ de Wayne na tela. E aprecia, também, a ambiguidade e complexidade de papéis como Ethan Edwards em Rastros de Ódio (um homem possuído pela vingança e fúria racista, e, no entanto, fiel a seu código de honra moral) e o sentimento profundo de perda ou isolamento de personagens como Nathan Brittles em Legião Invencível e Tom Doniphon de O Homem Que Matou o Facínora.
O Duke Morrison retratado nesse livro é um profissional, que chega sempre no horário no set, rápido para se desculpar quando se descontrolava e solícito com a equipe e os extras. Fumante inveterado, bebia muito, como vários de seus personagens, mas era também um amante de livros capaz de citar Shakespeare e Dickens. 
“Para o bem da clareza psicológica”, Eyman observa ainda que o ator sempre pedia para as pessoas o chamarem de Duke, não de John. “Sempre fui Duke, ou Marion ou John Wayne”, afirmou ele, em 1975. “É um nome que fica bem junto e é como uma palavra – JohnWayne.”
Michiko Kakutani, in The New York Times (fonte: www.estadao.com.br)

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