quinta-feira, 25 de outubro de 2012

A má sorte

“A desventura é grave para aqueles a quem chega inesperadamente; facilmente a suporta quem sempre a espera. Assim, também o ataque de um exército inimigo dispersa os soldados tomados de surpresa; mas se preparados para a guerra antes da guerra, ordenados e prontos repelem a primeira investida, que é mais furiosa. Nunca me entreguei à sorte, mesmo quando parecia que estivessem em paz comigo; todos os favores, dos quais muito generosamente  me cercava (riquezas, cargos, prestígio), coloquei-os em tal lugar de onde pudesse retomá-los, sem me aborrecer. Deixei sempre grande distância entre mim e eles: tirou-me os favores, portanto, não mos arrancou. A sorte contrária não diminui senão os homens que se deixam enganar pela prosperidade. Os homens que se agarram a seus presentes como a coisas das quais temos perpétua propriedade e que por eles querem ser invejados pelos outros, jazem prostrados e aflitos, quando os deleites falsos e fugazes abandonam sua alma vã e pueril, que ignora qualquer prazer real; mas, quem na prosperidade não se orgulhou, não se abala se as coisas mudam. Contra um e outro estado têm uma alma invicta, cheia de firmeza já experimentada, porque experimentou na boa sorte o que é útil contra a infelicidade. Por isso, como nas coisas que todos almejam possuir, sempre pensei que não houvesse algum bem verdadeiro (e as achei vazias e cobertas de uma maquilagem aparente e ilusória, sem nada que parecesse à sua aparência), assim agora, nesses que são chamados males, não encontro nada que seja tão horrível e duro como pode fazer temer a opinião do vulgo. A própria palavra exílio chega ao ouvido muito duramente e fere quem a ouve como triste e execrável justamente por essa convicção radicada em todos: assim decidiu o povo. Mas o sábio rejeita em grande parte os decretos do povo”.
Sêneca, in Consolação a minha mãe Hélvia

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